O amigo dos gatos
Fotografia: Artur Machado - Global Imagens
Eles
Sempre dei pousada a gatos, vagabundos quase todos, ora salvos de uma jaula, de uma sarjeta, ou de um contentor do lixo. Com nomes cristãos, e mais do que isso, artísticos e literários, os baptizei, Gelsomina e Leonardo, Felix e Henriqueta, favor que jamais me agradeceriam.
Não cessa de me intrigar o desprezo a que eles votam os cães da casa, esses sim, profundamente comovidos com a graça que lhes pus, Puck e Robin e Jasão, e mais recentemente Argos, aptos a proclamá-la com orgulho e alegria. E olham estes os gatos que os rodeiam com a tolerância, e não raro com a estima, de os saberem também da família do dono.
O que verdadeiramente me dói ao fim de contas é essa incapacidade de levarem os gatos ao plano do mimetismo, não apenas das maneiras, mas da própria figura, o reconhecimento que não sentem. Com os cães me pareço, comigo os cães se identificam, e transforma-se o amador na coisa amada. Não constituirá isto a mais tocante e a mais original prova de afecto?
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