Não é exclusivo do escritor o entendimento e o amor pelos gatos. Recordo, por exemplo, quanto Chopin amava o gato que acorria à sua companhia, mal o pressentia a dedilhar o piano. Adoçando-lhe as horas convulsivas com a companheira George Sand, o gato não era apenas para o compositor o lenitivo mas também uma compensação e alguma vez, quem sabe, o colaborador de algum som que o gato oferecia ao compositor, ao passar ao longo do piano.
Por mim, que até então não conhecera o convívio com qualquer gato, posso dizer que o meu amor e respeito mantidos pelo Jeremias não me inspiraram apenas o livrinho “Memórias do Senhor Jeremias o Gato das Botas Brancas” mas um amor e uma saudade que as lágrimas não extinguem. Dizem-me que os gatos têm uma alma e eu acredito, tão grande e sensível era o meu diálogo com o Jeremias que aspiro a encontrá-lo um dia, junto de quantos mais amei e já partiram, enlutando a minha solidão de desespero e dor. Sonho com ele e acordo com a sensação de que está a meu lado e me abraça, tocando-me o rosto com o focinhito frio e húmido, como que a querer minorar a minha dor e a minha solidão, em vão varridas pelas muitas lágrimas solitárias de saudade que me ficou quando a sua ausência levou o pouco que me restara da longa vida vivida.